Mais um post da nossa série para refletir sobre as importantes conquistas que esse tipo de experiência traz para o desenvolvimento infantil!
Desde seu nascimento o bebê é invadido por diversos estímulos ambientais que fazem parte do mundo que se inaugura para ele fora do abrigo seguro e aconchegante, que é o corpo de sua mãe. Todas essas informações novas que o atravessam inicialmente produzem desconfortos, sejam eles de origem física ou emocional, como fome, frio, calor, barulho, luz, cólicas, desamparo etc. Pouco a pouco essas vivências serão assimiladas e manejadas pelos adultos que estão ali cuidando para que a criança seja atendida em suas necessidades. Mas mesmo oferecendo tudo o que ela precisa para sobreviver a tantas demandas, sempre haverá uma brecha que não será preenchida por completo. E quer saber? Isso é fundamental para o desenvolvimento dos pequenos!
Quando a criança percebe que o seio materno não está disponível 24 horas por dia ela vive uma de suas primeiras frustrações, necessárias e inevitáveis para compreender que sua mãe também tem de trabalhar, comer, dormir, tomar banho e cuidar de outros assuntos que não giram sempre em torno da maternidade. O pediatra e psicanalista inglês Donald Woods Winnicott já dizia que a mãe deve ser suficientemente boa para o seu bebê, isto é, se manter atenta, devota e capaz de alimentar o seu filho afetiva e biologicamente, mas permitindo que ele também se desenvolva paulatinamente enquanto um ser humano independente. Embora passem boa parte do dia juntos, mãe e bebê têm de procurar as suas individualidades e aquilo que lhes falta deve ser buscado não somente no que um e o outro tem a oferecer, mas também em amigos, familiares, livros, brincadeiras, passatempos, esportes, experimentações e descobertas que o mundo propicia.
Esse desafio a princípio pode não ser tranquilamente aceito pela criança e, como forma de protesto, ela poderá chorar, mostrar a sua raiva e se rebelar de muitas formas. É aí que os limites precisarão entrar, inclusive para dar contorno a essas emoções que ficam à flor da pele na busca por satisfações.
Dizer “não” faz parte desse processo e é interessante que a criança possa entender os motivos pelos quais isso foi dito naquele momento. Assim ela se dará conta de que existem certos tipos de comportamentos e atitudes que não serão aceitos socialmente, como fazer birras para conseguir o que quer, gritar com as pessoas, machucá-las, burlar as regras presentes nos lugares que frequenta etc., tendo de encontrar outras formas para expressar aquilo que pensa, sente ou deseja. Por exemplo: “Você entende por que não pode puxar o brinquedo da mão da sua irmã enquanto ela está usando? Como você acha que isso pode ser resolvido? Que tal fazermos um combinado sobre esse assunto?”… Quando a construção dessa linha de raciocínio é feita junto com a criança, fica mais fácil conquistar uma compreensão, bem como implicá-la diante daquilo que fez, se debruçando em cima de novas alternativas às situações que já viu que não deram certo e podem sempre melhorar.
Entretanto, há alguns momentos em que “não” é “não” e que colocar um limite claro para a criança é fundamental, mesmo que ela, de início, não compreenda o motivo daquilo. É claro que isso pode ser retomado depois, principalmente com crianças um pouco mais velhas. Porém, há circunstâncias, em especial as que envolvem algum risco, que devem simplesmente ser interrompidas. Isso oferece segurança para a criança, pois além de protegê -la daquela situação, deixa marcas de que há um outro, adulto, responsável por impedi-la de ter certas atitudes que poderiam ter consequências com as quais a criança não conseguiria arcar.
Muitos pais, professores e adultos responsáveis tentam, por vezes, evitar que a criança seja contrariada, introduzindo doces, presentes e outras distrações, impedindo que a frustração apareça. Isso dará uma falsa ilusão de que os dissabores poderão ser continuamente afastados e substituídos por coisas mais prazerosas, mas isso não corresponde à realidade das coisas. A vida é repleta de adversidades e exige que sejam criados recursos para lidar com elas: a morte de uma pessoa querida, aprender a dividir os seus pertences com outras crianças, tomar vacina, se alimentar de maneira saudável, compartilhar a atenção com um irmãozinho ou irmãzinha que acabou de chegar, negociar papeis dentro das brincadeiras, enfim… em algum momento vai ser preciso ceder e rever um antigo repertório, que necessita de reformulações para se adaptar à novas circunstâncias. Isso não acontece da noite para o dia e é importante que seja feito com bastante cuidado, paciência e respeito de ambas as partes envolvidas nesse percurso de crescimento e aprendizagem!