Pesquisa evidencia os impactos do Projeto Aprender a Estudar Textos na compreensão de leitura | Labedu

Pesquisa evidencia os impactos do Projeto Aprender a Estudar Textos na compreensão de leitura

24 de julho de 2023

Em 2022, o Laboratório de Educação liderou, no município de Várzea Paulista (SP), mais uma experiência de implementação da metodologia de formação de educadores Aprender a Estudar Textos (AET), que convida professores de 4º e 5º ano do Ensino Fundamental a incorporarem um olhar para a linguagem dos textos como ferramenta para ensinar e aprender. O objetivo do AET é contribuir para que todos os estudantes desenvolvam os conhecimentos, habilidades e processos necessários à leitura e compreensão de textos didáticos, adquirindo ferramentas para aprender a pensar, analisar, interpretar, formar opinião, dialogar e transitar livremente pelo mundo do conhecimento.

A implementação do projeto beneficiou todos os alunos e professores da rede municipal de Várzea Paulista, bem como contribuiu para o fortalecimento da estrutura de formação continuada da rede. Pela primeira vez na trajetória do projeto, os Coordenadores Pedagógicos (CPs) foram incluídos de forma intencional no processo. O objetivo foi ampliar as condições para que esses profissionais pudessem auxiliar os docentes na implementação das atividades em sala de aula, incorporando estratégias como a observação da prática e a elaboração de registros.

Participaram da formação 63 profissionais, entre professores, coordenadores pedagógicos e técnicos da Secretaria Municipal de Educação. A ação alcançou 1.292 crianças, a totalidade dos alunos matriculados no 4º ano do Ensino Fundamental.

Avaliação de impacto

Com o objetivo de verificar os resultados da ação formativa no processo de aprendizagem das crianças, foi realizada uma pesquisa quase-experimental de avaliação de impacto, em parceria com o LEPES (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social da Universidade de São Paulo-Ribeirão Preto). Foram coletados dados, tanto em Várzea Paulista quanto em uma rede de ensino vizinha, localizada na região metropolitana de São Paulo, com características sociodemográficas e índices educacionais similares ao município participante. 

O levantamento e a análise de dados tinham a intenção de constatar em que medida o trabalho que o Laboratório de Educação faz em torno da linguagem acadêmica contribui não só para ampliar o repertório linguístico das crianças, mas também – ou não – para o desenvolvimento de outros conhecimentos e habilidades relacionadas à compreensão de leitura.

A pesquisa contemplou mais de 2.000 alunos, de 49 turmas do 4º ano do Ensino Fundamental destes dois municípios, em dois momentos distintos: nos períodos entre 4 e 19 de abril de 2022 e entre 16 de novembro e 1 de dezembro de 2022. Foram aplicadas duas provas de leitura, validadas internacionalmente: a Avaliação da Linguagem Acadêmica (ALA), criada pela professora Paola Uccelli, da Harvard Graduate School of Education, e o Estudo Internacional de Progresso em Leitura (PIRLS).

O PIRLS e sua primeira aplicação no Brasil

O PIRLS (sigla em inglês para Progress in International Reading Literacy Study) é um sistema de avaliação global reconhecido como um exame de referência internacional para aferir as habilidades de leitura no 4º ano do Ensino Fundamental, considerado um importante ponto de transição no desenvolvimento dos alunos como leitores. Focada especificamente nos processos de compreensão leitora e realizada a cada cinco anos, desde 2001, a prova é organizada pela IEA (International Association for the Evaluation of Educational Achievement), uma cooperativa internacional de instituições de pesquisa, acadêmicos e analistas.

Em 2021, a aplicação do PIRLS incluiu o Brasil pela primeira vez na amostragem, tendo sido implementada em larga escala em escolas públicas e privadas, abrangendo todo o território nacional. Participaram 187 escolas, 248 turmas de 4° ano do Ensino Fundamental e 4.941 estudantes, distribuídos em 24 estados e 143 municípios. Na amostra internacional, o PIRLS contemplou mais de 400.000 estudantes em mais de 13.000 escolas, em 65 países. O resultado do Brasil, 419 pontos, foi considerado extremamente preocupante por especialistas, colocando o país muito atrás dos países desenvolvidos e mostrando o efeito da pandemia na educação*.

Composto por dois textos, sendo um deles um texto informativo e o outro um texto narrativo, o PIRLS mensura o nível de proficiência a partir de quatro grandes dimensões: (i) análise e avaliação de conteúdo; (ii) capacidade de realizar inferências diretas; (iii) capacidade de localizar e retirar informações explícitas e (iv) interpretar e integrar ideias e informações. 

Aplicação do PIRLS no projeto AET e os resultados em comparação com o Brasil

Em 2022, o PIRLS foi aplicado no contexto do programa Aprender a Estudar Textos (AET) a fim de mapear a evolução das habilidades de compreensão de textos dos estudantes de Várzea Paulista (município que participou da formação baseada na metodologia do Labedu) e do município de controle**. 

Na coleta inicial, os estudantes de Várzea Paulista e do município de controle obtiveram uma pontuação abaixo da média brasileira: 322,19 e 311,96 pontos, respectivamente. Os estudantes participantes da pesquisa de avaliação de impacto do AET ficaram, na coleta pré-intervenção, à frente apenas da África do Sul (288 pontos). Já na coleta final, embora os resultados de ambas as cidades se mantivessem abaixo da média brasileira, a distância entre eles triplicou ao longo do ano (foi de 10 para 30 pontos). 

Ao final da implementação do programa AET, Várzea Paulista obteve uma pontuação média de 379,49 pontos, o que equivale ao avanço de duas posições no ranking internacional, ultrapassando o Marrocos (372) e o Egito (378), e se aproximando da Jordânia (381). Enquanto isso, o município de controle obteve uma pontuação média de 348,96 pontos, mantendo a mesma posição na comparação internacional.

Embora a distribuição das pontuações dos municípios fosse semelhante na coleta inicial e embora tenham sido observadas melhorias em ambos os contextos, as notas mais elevadas ficaram concentradas em Várzea Paulista. Ao aplicar o método de diferenças em diferenças, foi possível notar que o AET teve um efeito positivo e significativo no desempenho dos estudantes das escolas de Várzea Paulista, considerando as medidas de compreensão de textos narrativos e informativos. No que tange o texto informativo, a dimensão mais impactada pelo programa foi a de interpretação de informações, enquanto no texto narrativo, apesar de que todas as habilidades terem apresentado melhorias, destacaram-se a localização de informações e a inferência direta.

Revertendo algumas desigualdades

O PIRLS conta com uma escala que divide as pontuações em quatro faixas correspondentes ao nível de proficiência em leitura dos estudantes (avançado, alto, médio e baixo). O Brasil se encontra no nível "baixo", o que significa que os estudantes são apenas capazes de localizar informações explícitas e realizar inferências simples e diretas sobre as ações dos personagens em textos predominantemente simples. 

Realizando o mesmo exercício para encontrar as distribuições das notas em Várzea Paulista e no município de controle, foi possível observar que em ambas as cidades, tanto na coleta inicial quanto na coleta final, as pontuações dos estudantes estiveram concentradas na faixa abaixo de 400, seguindo assim a tendência brasileira. Entretanto, o município de Várzea Paulista teve uma evolução nas notas superior ao município de controle, de modo que a parcela de estudantes com a faixa mais alta de pontuação (nível avançado) quadruplicou entre os dois períodos.

Além disso, na coleta final, a parcela de estudantes de Várzea Paulista que obteve nota abaixo do básico diminuiu para menos da metade da amostra total, enquanto no município controle esse número ainda alcançou cerca de 60% dos estudantes. Essas diferenças sugerem que o programa AET tenha influenciado positivamente o desempenho em Várzea Paulista, não apenas nos níveis mais baixos de proficiência, mas também nos mais altos.

Ou seja, o programa demonstrou ter reduzido significativamente a porcentagem de crianças com níveis de compreensão abaixo do básico, além de ter colhido o aumento de compreensão em todos os níveis. Desta forma, o município de Várzea Paulista alcançou e, por vezes, superou a média brasileira segundo o PIRLS. Os resultados foram medidos após uma intervenção relativamente curta, de sete meses, tempo de implementação do projeto dentro da própria estrutura de formação continuada na rede.

Na tabela abaixo é possível observar a distribuição dos estudantes no nível da escala de desempenho no PIRLS no Brasil e também em Várzea Paulista e no município de controle do projeto AET em 2022.

Próximos passos do projeto Aprender a Estudar Textos 

Em 2023, o projeto Aprender a Estudar Textos permanece atuante nas escolas de Várzea Paulista, desta vez para os professores  do 5° ano do Ensino Fundamental de toda a rede municipal. Desta forma, os estudantes – os mesmos que vivenciaram a experiência em 2022 – continuam tendo a oportunidade de aprender com as 10 sequências de atividades modelares disponibilizadas na plataforma do projeto.

Concomitante à manutenção do projeto, o Laboratório de Educação está desenvolvendo uma série de materiais que permitirão a implementação junto a formadores de outras redes de ensino em edições futuras. Os resultados acima descritos trazem evidências de que o modo de atuação do Labedu, ancorado em torno de metodologias que prezam pela qualidade e pelo aprofundamento de conteúdos pedagógicos estruturantes, apresenta estratégias institucionais com potencial de enfrentar os desafios mais urgentes do nosso país. Desta forma, continuaremos desenhando mecanismos para que essa metodologia possa ser implementada em maior escala e alcançando novos públicos em outros contextos.

Apresentação dos resultados da implementação em Várzea Paulista

Para apresentar os resultados conquistados pelo trabalho ao longo de 2022, a diretora do Laboratório de Educação, Nicole Paulet Piedra, e a equipe do projeto estiveram no município de Várzea Paulista no dia 17 de abril. O encontro foi realizado em parceria com a Unidade Gestora de Educação de Várzea Paulista e o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social (LEPES), e contou com a participação dos diretores e coordenadores, profissionais da rede envolvidos na implementação do projeto. Segundo a gestora municipal, Magali Souza, a iniciativa veio ao encontro dos objetivos e metas da Educação Municipal. “O percurso formativo alia teoria e prática com estratégias para serem desenvolvidas em sala de aula que contribuem para o desenvolvimento da leitura dos alunos visando o sucesso escolar deles”, disse. “A formação é diferencial, pois ela dá atenção ao papel da coordenação pedagógica junto ao professor em sua atuação em sala de aula, desta forma permitindo um acompanhamento e integração das ações e resultados”, finalizou. Também participou do encontro a pesquisadora Angélica Sepúlveda, que acompanha o projeto. 

Além do evento presencial, foram realizadas duas lives para o compartilhamento dos resultados da implementação do projeto. As ações aconteceram no dia 23 de maio e buscaram alcançar todos os professores que participaram do projeto ao longo de 2022, bem como os que estão no percurso neste ano de 2023. 

Os resultados do AET 2022 foram publicados pelo Laboratório de Educação e estão disponíveis através do link: https://labedu.org.br/cases/aprender-a-estudar-textos-2022/ 

 

*O Brasil obteve média de 419 pontos, pouco acima da pontuação mais baixa da escala. De acordo com a avaliação do PIRLS, os estudantes na faixa dos 400 pontos, como os brasileiros, conseguem, ao ler textos literários predominantemente fáceis, localizar, recuperar e reproduzir informações, ações ou ideias explicitamente declaradas. Também são capazes de fazer inferências simples e diretas sobre as ações dos personagens. Já com relação a textos informativos, podem localizar, recuperar e reproduzir informações explícitas, além de fazer inferências simples e diretas para fornecer uma razão para um resultado. Os dados da avaliação foram divulgados no dia 16 de maio e mostram o Brasil à frente somente de Irã, Jordânia, Egito e África do Sul no ranking.
**Para que seja possível mensurar o efeito de uma intervenção, é necessário que haja dois grupos de indivíduos, um que receba a intervenção e outro que não. Todavia, esses grupos precisam ser suficientemente parecidos, para que a única distinção entre eles seja o recebimento ou não da intervenção.
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