25 de maio de 2023
Na última semana foram divulgados dados sobre as habilidades de leitura de estudantes do 4º ano do ensino fundamental do Brasil. A avaliação foi feita pelo Estudo Internacional de Progresso em Leitura (PIRLS), a partir de dados coletados em 2021 com uma amostra de 4.941 crianças. Os resultados mostram um quadro extremamente preocupante, com 62,2% dos estudantes brasileiros pontuando no nível baixo da referência internacional em compreensão leitora. (Para saber mais veja: Análise dos resultados do Brasil PIRLS e Brasil no Pirls 2021 - sumário executivo)
Vale ressaltar que o estudo mede aprendizagens necessárias para que as crianças aprendam sobre e através da leitura de textos cada vez mais complexos, numa etapa posterior à da alfabetização inicial. Para que esses dados qualifiquem a tomada de decisão dos gestores públicos da Educação, é preciso considerar o tipo de inserção em práticas letradas às quais as crianças de fato têm acesso no ciclo de alfabetização. Se o ensino da leitura nos primeiros anos da escolaridade for pautado por um trabalho fragmentado e mecânico com elementos da linguagem que se distanciam do texto, é provável que as crianças cheguem no 4º ano do ensino fundamental com um repertório conceitual e procedimental restrito para encarar os desafios específicos de compreensão que se colocam frente a novos gêneros textuais e propósitos leitores diversos. A aplicação em período pandêmico impõe a necessidade de um olhar cuidadoso para fazer generalizações. Ernesto Faria, diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), afirma que o diagnóstico necessita de mais aprofundamento, mas o cenário não parece ter relação apenas com a pandemia.
Entender os caminhos possíveis para enfrentar esse cenário passa por uma compreensão mais apurada dos contextos de uso e de aprendizagem que são promovidos nas escolas, não apenas nas aulas de Língua Portuguesa, mas no trabalho com leitura em todas as disciplinas. Para isso, o LEPES/USP e o Laboratório de Educação (Labedu) têm desenvolvido um instrumento que se propõe a investigar o raciocínio desenvolvido pelo professor para descrever, justificar e propor aulas voltadas à leitura de textos: o MARPP, sigla para “Mapeamento do Raciocínio Pedagógico do Professor”.
O MARPP capta as escolhas e preferências do professor em relação a formas de ensinar e desenvolver habilidades de leitura em seus estudantes. Para isso, explora quais objetivos, práticas e interações considera ao planejar situações de leitura, e questiona quais estratégias o professor incorpora antes, durante e depois da leitura, quando o objetivo é promover a compreensão dos textos?
A prática observada do professor em sala de aula não depende somente de seus conhecimentos ou de seu repertório de estratégias didáticas, mas também das condições e limitações contextuais que se apresentam no dia a dia. Compreender a prática é relevante, mas compreender a maneira como o professor pensa sua prática e como tal pensamento muda ao longo do tempo é igualmente relevante, pois revela os propósitos e expectativas que fundamentam o planejamento que se faz cotidianamente e como o professor acredita que suas aulas podem e devem ser.
Ter a possibilidade de mapear o raciocínio pedagógico do professor e relacionar tal mapeamento aos resultados dos estudantes em leitura poderá fornecer insumos para transformar o cenário atual. Instrumentos de pesquisa, como o MARPP, que permitam aprofundar de que maneira o ensino de leitura tem sido realizado será fundamental para desenhar processos formativos que apoiem os professores e redes no desenvolvimento da competência leitora dos estudantes. Nesse esforço orquestrado será necessário aproximar olhares e conhecimentos acumulados ao longo das últimas décadas, somando o know-how de pesquisadores de diferentes áreas e dos diversos profissionais que fazem a Educação acontecer no dia a dia: professores, coordenadores, diretores e equipes técnicas das Secretarias de Educação.