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Alguns mitos sobre a adoção de crianças por casais homossexuais

Photo: Getty Images/ ONOKY - Eric Audras.
4 de janeiro de 2016

Que tal pensarmos sobre mitos atuais envolvendo a adoção de crianças por casais homossexuais? O que pesquisas recentes informam sobre o desenvolvimento dessas crianças?

A primeira adoção legal de uma criança por um casal homossexual ocorreu em 1986, no estado da Califórnia, nos Estados Unidos. Quase 30 anos depois deste fato, ainda coexistem diferentes legislações sobre o tema, a depender dos países e, em alguns casos, dos diferentes estados.

Qualquer que seja a norma vigente há, ainda, quem considere errado uma criança ser educada por um homossexual. E as consequências desse tipo de homofobia não recaem somente sobre o adulto, mas também sobre a criança que pode vivenciar situações de discriminação no seu dia a dia. As ideias e justificativas que geram atitudes contrárias à adoção de crianças por esses casais são, muitas vezes, oriundas de mitos.

Estudos realizados pela Universidade de Cambridge, citados numa reportagem da revista Superinteressante, contribuem para desfazer alguns desses mitos. A reportagem apresenta e comenta 4  mitos, com o apoio também de outros estudos, e replicamos, a seguir, algumas das observações apresentadas  e depoimentos de pesquisadores.

Mito 1. “Os filhos serão gays” – Embora pareça lógico que isso ocorra, afinal eles vão crescer em um ambiente em que o padrão é o relacionamento homossexual, isso não ocorrerá necessariamente. Se fosse assim, seria difícil, por exemplo, explicar como filhos homossexuais podem nascer de famílias heteroparentais. Um estudo da Universidade Cambridge comparou filhos de mães homossexuais com filhos de mães héteros e não encontrou nenhuma diferença significativa entre os dois grupos quanto à identificação como homossexuais. Mas isso não quer dizer que não existam algumas diferenças. As famílias homoparentais vivem num ambiente mais aberto à diversidade. “Se você cresce com dois pais do mesmo sexo e vê amor e carinho entre eles, você não vê nada de estranho nisso”, conta Arlene Lev, professora da Universidade de Albany. Mas a influência para por aí. Ou seja, não dá para afirmar que a orientação sexual dos pais tenha o poder de definir a dos filhos.

Mito 2. “Eles precisam da figura de um pai e de uma mãe”
– Filhos de homossexuais não são os únicos que crescem sem um dos pais. Durante a 2ª Guerra Mundial, estima-se que 183 mil crianças americanas perderam os pais. No Brasil, 17,4% das famílias são formadas por mulheres solteiras com filhos. Na verdade, os papéis masculino e feminino continuam presentes como referência mesmo que não seja nos pais. “É importante que a criança tenha contato com os dois sexos. Mas pode ser alguém significativo à criança, como uma avó”, explica Mariana Farias. Se há uma diferença, ela é positiva. “Crianças criadas por homossexuais são menos influenciadas por brincadeiras estereotipadas como masculinas ou femininas”, diz Arlene Lev. Uma pesquisa feita com 56 crianças de pais homossexuais e 48 filhos de héteros apontou a maior probabilidade de meninas brincarem com armas ou caminhões. Brincam sem as amarras dos estereótipos e dos preconceitos.

Mito 3. “As crianças terão problemas psicológicos por causa do preconceito” Elas sofrerão preconceito. Mas não serão as únicas. No ambiente infantil, qualquer diferença – peso, altura, cor da pele – pode virar alvo de piadas. Não é certo, mas é comum. Uma pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas com quase 19 mil pessoas mostrou que 99,3% dos estudantes brasileiros têm algum tipo de preconceito. Entre as ações de bullying, a maioria atinge alunos negros e pobres. Em seguida vêm os preconceitos contra homossexuais. No caso dos filhos de casais homossexuais analisados pelo National Longitudinal Lesbian Family Study, quase metade relatou discriminação por causa da sexualidade das mães. Por vezes, foram excluídos de atividades ou ridicularizados. Felizmente, isso não é sentença para uma vida infeliz. Pesquisas que comparam filhos de homossexuais com filhos de heterossexuais mostram que os dois grupos registram níveis semelhantes de autoestima, de relações com a vida e de perspectivas para o futuro. Da mesma forma, os índices de depressão entre pessoas criadas por homo e por heterossexuais não é diferente.

Mito 4. “Essas crianças correm risco de sofrer abusos sexuais”
Esse mito é resquício da época em que a homossexualidade era considerada um distúrbio. Foi só em 1973, por exemplo, que a Associação de Psiquiatria Americana retirou a homossexualidade da lista de doenças mentais. É pouquíssimo tempo para a história. O estigma de perversão, sustentado também por líderes religiosos, mantém a crença sobre o “perigo” que as crianças correm quando criadas por homossexuais. Até hoje, as pesquisas ainda não encontraram nenhuma relação entre homossexualidade e abusos sexuais. Nenhum dos adolescentes do National Longitudinal Lesbian Family Study reportou abuso sexual ou físico. Outra pesquisa, realizada por três pediatras americanas, avaliou o caso de 269 crianças abusadas sexualmente. Apenas dois agressores eram homossexuais. A Associação de Psiquiatria Americana ainda esclarece: “Homens homossexuais não tendem a abusar mais sexualmente de crianças do que homens heterossexuais”.

Crianças precisam ser educadas em ambientes saudáveis, do ponto de vista emocional, cognitivo, social e físico. Precisam de cuidados, de amor, de atenção, de informação, precisam interagir, crescer e compreender o mundo que as cerca. E tudo isso pode ser assegurado tanto por uma família homoparental, quanto por uma heteroparental ou mesmo por famílias com outras constituições. Ou seja, a forma como a família está composta não é o que define a interação com a criança e tampouco as condições que serão oferecidas para seu desenvolvimento.

Também vale lembrar que mitos e tabus são criados desde os primórdios da vida em sociedade e certamente muitos outros ainda aparecerão, seja sobre esse tema, seja sobre outros. O fundamental, porém, é olharmos para as situações que nos apresentam à diversidade, sem negá-las ou avaliá-las com preconceitos, e ajudar as crianças a fazer o mesmo.

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