24 de maio de 2017
Tanto fora quanto dentro da escola a brincadeira precisa integrar o dia a dia das crianças. Mas será que a brincadeira é a única forma de aprender nas creches e pré-escolas?
Uma recente publicação do jornal O Estado de S.Paulo apresenta a experiência de algumas escolas de Educação Infantil que optaram por dar à brincadeira um amplo espaço na rotina das crianças, defendendo-a como atividade primordial na infância e fonte potente de aprendizagens. Nesta mesma matéria, destacam que isso muitas vezes contraria o que pensam as famílias que tendem a valorizar as situações de “estudo” nas quais as crianças “aprendem” ao invés da brincadeira, mesmo nesse segmento inicial da escolaridade. Mas será que essa distinção acontece de tal modo? Brincar e aprender se opõem? Ou, por um prisma diferente, será que os pequenos só aprendem brincando?
Embora sempre presente na pauta de discussões educacionais, quando se pensa nas crianças de 0 a 5 anos, há várias formas de se compreender a brincadeira. Muitas vezes, vira sinônimo apenas de diversão e de algo a ser realizado livremente pelas crianças. No entanto, o brincar não é inata, é um bem cultural que passa de geração em geração e, como tal, precisa ser aprendida e apropriada ao longo da infância e é ainda uma atividade de extrema importância nessa etapa do desenvolvimento. Raramente pode ser tomada como “livre”, já que de alguma forma sempre acontece mediada pelo espaço, pelos objetos ou brinquedos disponíveis, pela relação com outras crianças ou pela intencionalidade dos educadores.
A brincadeira possibilita experiências de grande significado na infância, permitindo que as crianças ampliem sua inserção social e cultural e que atuem como sujeitos produtores de cultura, já que exploram, modificam, reinventam e criam. Ou seja, a brincadeira é realmente uma fonte de múltiplas aprendizagens. Tanto é assim, que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil a mencionam como um dos eixos norteadores das experiências que devem ser propiciadas às crianças nas creches e pré-escolas.
Por outro lado, não é apenas brincando que se aprende e tampouco pode ser a brincadeira o único eixo a partir do qual as instituições de educação infantil precisam estruturar as experiências e a rotina das crianças. As interações das crianças, com os adultos e com os distintos objetos de conhecimento, que como a brincadeira se constituem em bens culturais, são também um eixo norteador igualmente definido pelas Diretrizes Curriculares. As crianças pequenas se questionam sobre o mundo em que vivem, sobre o universo físico e social, sobre os modos de comunicação, sobre os números, os cálculos e suas situações de uso, e por aí vai. Assim, as creches e pré-escolas precisam inserir no cotidiano infantil experiências que abarquem o potencial de questionamento, de exploração, de investigação e de busca por respostas e explicações que as crianças têm. Nada disso deve acontecer por meio de situações formais de estudos ou de aulas tradicionais, mas na interação direta e participação em práticas construídas socialmente: preparar uma receita, seguindo o passo a passo do texto e, ao mesmo tempo, refletir, descobrir, observar e analisar as distintas misturas que ocorrem no processo de preparo; participar da organização de uma atividade de arte na qual é preciso contar quantos pinceis e potes de tinta são necessários para o grupo; realizar experimentos, observar, explorar e ouvir informações de textos de divulgação científica ou acessá-las por meio de documentários ou entrevistas; visitar museus e exposições, aprender sobre artistas, obras, épocas e aprender a apreciar etc.
Enfim, a brincadeira é, sim, sinônimo de aprendizagens, mas cabe à Educação Infantil potencializar em igual medida experiências que impliquem em interações das crianças com os mais distintos conhecimentos e bens culturais. Desse modo, poderá cumprir de modo efetivo o que as próprias Diretrizes estabelecem como objetivos:
“A proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve ter como objetivo garantir à criança acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças.”