22 de maio de 2017
Muitas crianças já se divertiram com o famoso jogo de tabuleiro Banco Imobiliário. Poucas delas, porém, experimentaram uma versão diferente dessa brincadeira que, infelizmente, é mais parecida com a realidade.
Em um experimento social criado pela associação francesa Observatoire des Inégalités, algumas crianças foram convidadas a brincar com uma versão diferente do jogo Banco Imobiliário. Nessa proposta, foram subvertidas as regras clássicas, que garantem que todos comecem com a mesma quantidade de dinheiro e de propriedades e que sofram os mesmos tipos de penalidades. Tal como acontece na vida real, mulheres, negros, minorias étnicas e deficientes passaram a ter desvantagens previstas pelas novas regras do jogo.
Acima, o vídeo publicado pelo Observatoire des Inégalités, que mostra como ocorreu o experimento com as crianças. Só há legendas disponíveis em inglês, mas deixamos abaixo uma nota com a tradução.*
A atividade ocorreu sob protestos das crianças, que afirmavam a injustiça das regras e perguntavam o por quê delas. O adulto que conduzia a experiência apenas dizia: “É assim que as coisas são… Essas são as regras”. Infelizmente, essa versão do jogo parece reproduzir com mais precisão a forma como determinadas pessoas são privilegiadas pelo contexto social e como outras sofrem com a desigualdade, não só na França como aqui no Brasil.
É esse mundo que queremos deixar para as crianças? Será que tudo o que temos a dizer a elas sobre o assunto é que “as coisas funcionam assim”?
A intenção do experimento foi justamente chamar a atenção dos franceses para o quanto ainda é necessário avançar para chegar a uma situação social mais igualitária. O Brasil também tem um longo caminho a percorrer nesse sentido. Cabe a nós, adultos, lutar por deixar para nossas crianças um mundo mais justo, além da oferta de uma educação crítica que permita que os pequenos aprendam a se posicionar enquanto cidadãos desde cedo e, do mesmo modo, respeitar e valorizar a diversidade.
* Tradução livre do vídeo
Narrador: “Pedimos às crianças que jogassem um famoso jogo de tabuleiro. Em geral, as regras são as mesmas para todos, mas não dessa vez.”
Adulto: “Bom dia, crianças”
Crianças: “Bom dia!”
Adulto: “Metade dos jogadores começa com 1500 euros, a outra metade com 750 euros.”
Crianças: “Mas isso não é justo!”
Adulto: “Um dos jogadores começa o jogo com 3 ruas e 2 casas.”
Menino: “Três ruas e duas casas?”
Menina: “Mas não! Isso é injusto!”
Adulto: “Um jogador tem uma carta que significa nunca ir para a cadeia.”
Criança: “Oh!!”
Adulto: “Você está preso.”
Criança: “Por quê?”
Adulto: “É assim que é… Essa é a regra.”
Criança: “Um, dois, três, quatro…” (Mexendo a peça no tabuleiro).
Adulto dirigindo-se ao menino: “Como você usa muletas, não é permitido comprar estações de trem.”
Adulto dirigindo-se à menina: “Quando você passa pela casa inicial, em geral ganha 200 euros. Como é uma menina, vai ganhar 150 euros.”
Menina: “O quê?!”
Menino: “E os meninos? Quanto ganham quando passam pela casa inicial?”
Adulto: “200 euros.”
Menino: “Por quê?”
Adulto não responde. Diz, dirigindo-se a outro menino: “Agora você joga com esses dados.”
Menino: “Mas eles só têm o número um em todas as faces! Isso não é justo!”
Adulto: “Não tenho certeza que você vencerá, então.”
Menino: “Vê como estão trapaceando?”
Adulto, dirigindo-se a outro menino: “Você, por exemplo, pode comprar casas só aqui.” (Aponta um local do tabuleiro com o dedo).
Crianças: “E por quê?”
Menino: “Isso está me deixando bravo!”
Letreiros (referentes à França):
Na França, quando procuram habitação, apenas 14% de pessoas de minorias étnicas recebe respostas positivas.
66% de pessoas com alta renda possuem propriedades versus 16% de pessoas de baixa renda.
Pelas mesmas infrações, pessoas com baixa ou nenhuma renda têm 3 vezes mais chance de serem condenadas.
Independentemente do trabalho, as mulheres ganham 23% menos do que os homens.
Hoje, na França, apenas 30% das estações são acessíveis a pessoas com deficiência.
Crianças em desvantagem social progridem mais lentamente na escola; 35% delas repete uma série antes dos 14 anos.
Criança: “Eu não acho que essas novas regras sejam muito justas… Acredito que não são justas em absoluto!”
É hora de mudar as regras.
Para saber mais sobre o assunto:
Para mostrar prejuízo da desigualdade social, crianças jogam Monopoly com regras injustas