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Casos e Referências

As várias facetas de um bilhete

Imagem retirada de G1
17 de setembro de 2018

Bilhete de garoto de 5 anos gera inúmeros comentários em páginas das redes sociais. Aqui trazemos reflexões sobre alguns deles.

Gabriel Lucca tem 5 anos e estuda numa escola de educação infantil na cidade de Bocaina, interior de São Paulo. Segundo sua professora Paula Renata Bobardelli em reportagem para o G1, o menino é bastante inteligente e criativo, além de um ávido escritor de bilhetes, como este que ele entregou para sua mãe: “Senhores Pais, amanhã não vai ter aula porque pode ser feriado. Assinado: Tia Paulinha. É verdade esse bilhete.”

Postado em uma rede social, o post viralizou. Como esperado, muitos comentários foram feitos. Em sua maioria, as pessoas tendem a achar graça da brincadeira e considerar o menino “sabido” e “criativo”. Porém, alguns outros olhares sobre o bilhete chamam a atenção e merecem ser explorados aqui.

Alguns comentários apontam certa preocupação pelo fato de o garoto “mentir” desde tão pequeno e parte deles até sugere como os adultos cuidadores podem gerir este “problema”. É fundamental, antes de tudo, considerar aspectos que não estão explícitos no bilhete, mas que fazem parte do próprio desenvolvimento infantil. O primeiro deles diz respeito a uma descoberta vivenciada por volta dos 5 ou 6 anos e que também está relacionado às conquistas no conhecimento da linguagem, o que permite que as crianças se expressem e se comuniquem mais amplamente com outras pessoas, explicando e argumentando. Os pequenos descobrem a possibilidade de “brincar de enganar”: escondem uma chave, por exemplo, argumentam não ter feito tal coisa e depois riem quando o adulto a encontra etc. São casos nos quais estão explorando brincadeiras dessa ordem, que de modo algum significam que a criança está se tornando mentirosa.

Esse fato também tem relação com algo bem comum nesse momento do desenvolvimento: descobrem a possibilidade de testar a autoridade dos adultos com os quais convivem de forma mais próxima, em especial no âmbito familiar. Muitas vezes, tais atitudes estão relacionadas a esse enfrentamento ao adulto e, também neste caso, não significam que a criança começa a mentir ou que passará a fazer isso necessariamente de modo frequente – é claro que vale observar se tais atitudes começam a ultrapassar limites, colocam alguém em risco ou adquirem um tom muito agressivo.

No caso de Gabriel, a partir do que relata sua professora, foi mesmo uma brincadeira imitando essa comunicação usualmente feita por ela mesma.

Outra leva de comentários fez referência ao fato “triste” de que o menino não gosta da escola e por isso quer “faltar na aula”. Isso também está longe de ser o que parece ter ocorrido. Gabriel explicita ter uma ótima relação com a escola e com as experiências que vivencia cotidianamente nesse espaço. De fato parece ter sido uma brincadeira, como apontado acima, ou até mesmo desejo de passar mais tempo em casa, de poder brincar ali ou até de poder interagir mais tempo com os familiares, algo realmente bem possível em “feriados”. Isso pode acontecer com qualquer criança. Não é possível fazer uma relação direta entre a vontade de ficar em casa com um sentimento negativo em relação à escola. É claro que queremos que todas as crianças interajam com este espaço coletivo de trocas e de aprendizagens de forma extremamente favorável e apreciem estar lá. Essa tem que ser mesmo uma preocupação dos adultos em relação aos pequenos. E pelo visto isso já acontece com Gabriel.

Um bilhete de uma criança de 5 anos e múltiplos olhares sobre ele, múltiplas justificativas para sua atitude, múltiplas sugestões de intervenções… E nem sempre as tantas facetas a partir das quais o bilhete foi interpretado se atentam a aos aspectos mais importantes: o protagonismo deste pequeno, sua criatividade, a forma como se expressa por escrito, a forma como parece ter se apropriado de como compor um bilhete, a relação próxima que deve ter com os adultos cuidadores para brincar deste modo. Também é interessante considerar o próprio desenvolvimento infantil e as conquistas que as crianças seguem tendo, como a ampliação da comunicação por meio da linguagem e a compreensão tão sutil e abstrata de uma “brincadeira de enganação”.

Vale pensarmos sempre sobre todos esses aspectos quando buscamos compreender as atitudes das crianças! E você, teria algo a compartilhar sobre isso? Já vivenciou situações como esta? Compartilhe conosco!

Ah, o nosso parceiro Portal Lunetas publicou um post a partir do mesmo bilhete, focando nos conhecimentos sobre a linguagem escrita que Gabriel explicita. Vale conferir aqui!

Fonte de algumas das informações: G1

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