6 de dezembro de 2015
4) No seu ponto de vista, que aprendizados a dança traz às crianças?
O movimento é fundamental para a vida e a saúde está relacionada diretamente com a possibilidade de mover-se. Apesar disso, ainda há alta porcentagem de sedentarismo, incluindo jovens de todos os níveis sociais. Observa-se que a prática de uma atividade com a qual se cria um elo, não só o de “fazer”, mas o do “sentir”, resulta em um envolvimento mais duradouro.
A dança surge das experiências motoras básicas, como andar, correr, saltar, subir, descer, rolar, entre outras. O que a dança faz é, a partir desse básico, evoluir a movimentação, refinando o gesto. É um caminho que vai da pedra bruta ao cristal. Com isso, uma longa lista de aquisições como lateralidade, equilíbrio, organização espacial, propriocepção serão peças importantes para facilitar os gestos harmônicos no espaço. E isso significa dançar. Quando o corpo consegue receber uma ordem e realizar com menos sofrimento, significa que houve um desenvolvimento psicomotor acompanhado de um amadurecimento cognitivo.
Dizemos na fisioterapia que a estrutura governa a função. Atualmente, a luta pela forma do corpo e pelos resultados, inverteu esse valor. Há busca pelo belo, pelo perfeito, pelo externo, em detrimento do respeito pelo que se é, pelo “como eu funciono melhor em relação ao que eu sou internamente?”. A dança é a liberdade e a democracia: qualquer um pode dançar independente da sua forma, tamanho, cor… cria-se uma nova relação com o corpo. Todos são iguais, ninguém é melhor ou pior. Ela não é uma atividade competitiva, cada um faz do seu jeito o que é proposto. Gera sentido de grupo, cooperação e respeito. O objetivo é oferecer uma movimentação acessível, que não está ligada à performance. A exploração e a descoberta que importam.
Além disso, por estar associada a outros elementos que não só ao movimento, mas à música, à arte, à emoções e sentimentos, vejo a dança como uma atividade muito completa e importante a ser cada vez mais introduzida na vida escolar.
5) Lembra-se de algum comentário interessante que ouviu das crianças sobre a experiência de dançar com essa experiência que o NA DANÇA! na escola oferece?
Ouvi muitos comentários interessantes, mas vou relatar aqui uma experiência na escolar pública e outra na escolar particular. Esses relatos foram passados pelos professores.
Na primeira escola pública em que desenvolvemos o projeto, houve uma conversa com os alunos no espaço onde ocorrem as apresentações da escola. Havia praticamente 200 adolescentes, a grande maioria de bairros carentes de São Paulo, ouvindo atentamente o depoimento de três professores convidados: de Angola, Ermi Panzo, de Moçambique, Ines Queme e do Líbano, Mohammad Al Jamal. Foi muito emocionante. Cada um deles contou as razões que os fizeram sair de seu países, as dificuldades, o preconceito, os medos. Houve imediatamente uma identificação dos alunos com esses professores que, jovens, já tinham enfrentado muitas dificuldades, mas que são batalhadores, vencedores e cheios de vida. Foi comovente ouvir as perguntas e reações dos alunos. Depois cada um deu uma oficina de dança, foi uma celebração. Fiquei sabendo pelo professor que fez a ponte com a escola que uma menina negra, pobre, que tem uma história muito difícil de família, depois da palestra rebatizou seu bicho de pelúcia de estimação, importante foco de afeto para ela, de Ermi Panzo. Imagino que foi marcante encontrar algo que faz acreditar que existe possibilidade de novos caminhos e que pode-se ter alegria e esperança.
Na escola particular, um professor relatou que, após a oficina de dança e depoimento da história pessoal com um professor negro, um aluno comentou que começava a olhar com outros olhos a empregada negra que trabalhava em sua casa. Uma contribuição social importante.
A dança, que nesse projeto é o fio condutor, certamente é um veículo transformador. Ela age no inconsciente e no corpo, chegando nas ações e resultados.