28 de dezembro de 2017
Conheça a iniciativa de uma escola paulistana neste post do nosso parceiro Portal Aprendiz.
Em um mundo predominantemente ouvinte, pouco se compreende e se discute sobre o acesso da população surda aos debates da agenda política do país, e do direito que esta tem a participar ativamente da vida em sociedade. Ao mesmo tempo, quase não há espaço para apreciação e valorização da cultura surda, e da forma com que esta possibilita um outro jeito de ver o mundo, explorando outros sentidos e outras formas de expressão. Com o objetivo de responder a estes desafios, e buscando a inclusão de adolescentes surdos no contexto do mundo ouvinte, a Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos (EMEBS) Vera Lúcia Aparecida Ribeiro, em São Paulo, realiza o projeto Teatro em LIBRAS.
Em 2016, no contexto da crise política que levou ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff, a professora Maria Aparecida Pereira de Castro Augusto, responsável pelo projeto, identificou que seus estudantes estavam à margem da discussão que envolvia o país, sem acesso a diferentes fontes de informação e com pouca contextualização dos fatos e eventos políticos que diariamente se encontravam na pauta nacional.
Para falar de política com adolescentes de 7°, 8° e 9° anos, a professora, em diálogo com seus pares, deu início a rodas de conversa com os estudantes sobre o que estava acontecendo no país, mobilizando diferentes veículos de mídia como fontes de informação. Em seguida, trabalhou-se a diferença de discursos destes veículos, e a relação e poder da mídia na sociedade, utilizando a leitura do clássico de George Orwell, “A revolução dos bichos”. Com os estudantes bastante mobilizados e interessados no texto, surgiu a ideia de montar uma peça, aberta à comunidade, encenada e produzida pelos estudantes surdos. Foram 28 alunos participando da produção, elaboração e apresentação da peça em LIBRAS, tendo os professores como intérpretes para o português para a plateia ouvinte.
Para a construção do texto em LIBRAS são muitos os processos – adaptação do texto verbal em gestos e, posteriormente, contextualização das emoções, entrelinhas, sugestões e figuras de linguagem presentes no universo falado. Envolvendo estudantes, professores, familiares e parceiros da comunidade no processo, a peça se tornou importante ferramenta para fomentar a inclusão e a sociabilização dos alunos surdos, desenvolvendo suas habilidades artísticas, de comunicação e de compreensão do mundo, que muitas vezes está distante.
Em 2017, o projeto teve sequência com a montagem e encenação de “A volta ao mundo em 180 gestos”, com ainda maior produção autoral das meninas e meninos. Encenada em 22 de novembro no CEU Vila Atlântica, alunos da EMEBS apresentaram aos ouvintes de diversas escolas da região um enredo que discutia algumas das tradições de seis países ao redor do globo. Baseada na leitura da obra de “A volta ao mundo em 80 dias”, de Júlio Verne, diferente da primeira, não foi traduzida e sim toda interpretada com gestos e linguagem corporal.
“A LIBRAS é a segunda língua mais falada do Brasil. É muito rica, mas ainda ignorada. Ao apresentar uma peça para pessoas da mesma faixa etária, buscamos iniciar a discussão sobre a cultura surda”, explica Maria Aparecida. “E o teatro é universal. Para meus alunos, é um empoderamento saber que, quando estão no palco, todos podem entendê-los ”, conclui.