O que podemos aprender com a educação que tribos indígenas do Xingu dão às suas crianças? | Labedu
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O que podemos aprender com a educação que tribos indígenas do Xingu dão às suas crianças?

5 de fevereiro de 2018

Saiba mais sobre a experiência de uma antropóloga e seu filho de 3 anos nas aldeias do Parque Indígena do Xingu.

Em entrevista à BBC, a antropóloga Camila Gauditano de Cerqueira, consultora de educação do Instituto Socioambiental (ISA), contou o que aprendeu ao visitar o Parque Indígena do Xingu com seu filho, Martim, de 3 anos. Na viagem, que durou 20 dias, os dois puderam entrar em contato com três etnias da região: os Kisêdjê, Ikpeng e Yudja. Camila tinha o objetivo de conversar com diretores e professores das aldeias. Enquanto isso, seu filho brincava com as crianças e suas famílias. E o que será que aprenderam com essa experiência?

A BBC publicou as observações da antropóloga acerca de alguns momentos especiais do cotidiano das tribos visitadas. Vamos compartilhar com vocês alguns deles e recomendamos a leitura da matéria completa.

Um dos elementos que Camila observou é que nas aldeias as crianças ficam muito mais livres e são mais autônomas para realizar diferentes brincadeiras e atividades cotidianas. Elas mesmas ajudam a cuidar umas das outras e aprendem os limites de seu corpo e da natureza. Isso tem a ver com o contexto específico em que vivem, considerando a organização social, familiar e o contato com o ambiente.

Hora do Banho na tribo Kisêdjê

“O banho é o momento em que a criança se integra com o ambiente da água. Aprende os limites do próprio corpo, desenvolve suas potencialidades, a pesca, a navegação. O ambiente é preparado pela comunidade para esse fim. Deixam o fundo bem limpinho, tiram o mato da beira do rio, você sabe onde pode ir e onde não pode. Colocam uma estrutura feita com um tronco de madeira onde você pode sentar a criança, ou lavar roupa”.

“Crianças menores ficam na beira; as maiores, mais ao fundo; outros mergulham. É uma experiência do coletivo, das brincadeiras. A criança pequena observa o que é possível fazer e realizar nesse lugar, de acordo com suas capacidades, em diferentes fases. Martim ficou encantado”.

Cuidados com as crianças

Quando o bebê é muito pequeno, a mãe não vai à roça para ficar com ele. Em algumas tribos o pai também acompanha esse momento. Aos poucos, vão recebendo a ajuda de parentes e deixando a criança com uma tia ou com a avó. Em relação ao desmame, Camila diz:

“Já vi criança de três anos sendo amamentada. Lá é livre demanda, quer mamar, mama. Na mãe, na tia, na avó… às vezes, a mãe saiu mas a avó está ali e tem leite. Ela dá. É normal.”

A antropóloga também relata:

“Quando a mãe vai para a roça, a criança, já mais velha, vai com ela. Mas quando a mãe está em casa, na aldeia, as crianças estão no pátio, indo atrás de passarinho, de bichinho, brincando”.

“A partir de três anos, já são bem mais independentes em relação à mãe (do que as da cidade). Elas têm circulação livre na aldeia, mas nunca estão sozinhas. Estão sempre acompanhadas de crianças do mesmo tamanho ou maiores.”

“Na nossa sociedade você não tem esse apoio coletivo que existe no convívio de aldeia. Não partilhamos a educação de nossos filhos com a comunidade.”

Birra infantil

“Não sei por que motivo, uma criança começou a chorar muito. Os pais estavam saindo do rio, talvez ele quisesse ficar mais tempo na água… Os pais simplesmente saíram andando. A criança foi atrás, chorando”.

“Não tem essa bajulação, de ficar em cima, ‘o que foi, o que aconteceu? Se você parar de chorar, te dou isso…’ Tomaram a atitude de não alimentar a birra. Essa é uma observação muito pessoal, mas acho que o princípio é: quanto menos bola se dá para a birra, mais a criança tem condições de resolver suas próprias frustrações.”

O importante dessas situações é observar a multiplicidade de possibilidades que existem quando pensamos nas formas de se organizar socialmente. A maneira que conhecemos não é a única e podemos aprender observando diferentes contextos e experiências. Não se trata de transpor outras realidades para a nossa, mas sim de questionar nossas referências e criativamente encontrar nosso próprio caminho de educar as crianças.

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